domingo, 9 de janeiro de 2011

Pequenos besouros negros

Pequenos besouros negros repousam
onipotentes e divinizados
como duas opalas exoesquelética:
o meu pecado foi tê-los partido com machado,
porque quando partidos,
desmancham-se em geléia.

*
Copiei milhões de faces
até que me fosse dado
o direito de ser;
era pai, era filho, era avô;                                                              
era aquilo que por decência
deveria ser antes de envelhecer
ou até que por fim, àqueles,  os juízes da minha vida,
morressem
e quando morrem
são como pequenos besouros negros:
puntiformes, reclusos
como sempre foram.

Rasguei milhões de contratos
e aí me concedi
o direito de ser:
não me incumbi de papéis
não quis ser forte, fraco, nem homem, nem mulher ;
não me interessava por noticiários;
deixei que o corpo fosse o relógio
dos meus dias.

Perguntassem-me se há felicidade em ser apenas,
responderia que não.
Existe apenas uma rigidez nos músculos do pescoço
que sustenta sua cabeça pela tensão da estrutura;
uma amargura latente que lhe rói pertinaz
e não há alopático que resolva
por muito tempo.

No fim seremos como eles:
pequenos besouros negros.

3 comentários:

  1. esse poema é um zumbido daqueles...

    salve, salve!

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  2. quem me dera poder rasgar contratos e, antagonicamente, ganhar, ao invés de perder direitos... o mundo seria uma maravilha, ainda que não findasse a rigidez nos músculos do pescoço que sustenta a cabeça pela TENSÃO da estrutura...

    sobrevivemos! ^^

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